AS ENCANTADAS


Contam os Caigangues do Paraná, que há muito tempo atrás, na Praia das Conchas, ao sul da Ilha do Mel, na gruta das Encantadas, viviam lindas mulheres que bailavam e cantavam ao nascer do Sol e ao crepúsculo. Dizem que o canto delas era inebriante, dormente e perigoso para qualquer mortal. Se um pescador as escutasse, por certo perderia o rumo de sua embarcação, indo bater nas rochas e naufragar. Entretanto, certa vez, um índio corajoso e destemido aventurou-se a tentar se aproximar delas. Colocou-se à espreita no alto do rochedo.

Quando os primeiros raios multicoloridos de luz despontavam ao leste, o jovem começou a ouvir a suave e doce melodia proveniente do interior da gruta. E mulheres nuas, desenhadas de sombras, foram surgindo. À medida que as bailarinas alcançavam a boca da gruta, o canto tomava mais ênfase, mais intensidade:

"Cagmá, iengvê, oanan eiô ohó iá, engô que tin, in fimbré ixan an ióngóngue, iamá que nô ô caicó, katô nô ó eká maingvê..."

Queriam dizer: " Passe com cuidado a ponte. Viva bem com os outros; assim como eles vivem bem, você também poderá viver. Lá você verá muita coisa que já viu aqui em minha terra, assim como o gavião. Teus parentes hão de vir te encontrar na ponte e te levarão com eles para tua morada."

Estranhamente o índio não adormeceu, justo o contrário, não desgrudou o olho do belo ritual. As misteriosas moças eram dotadas de tão rara beleza, nuas e com longos cabelos de algas, que o intruso acabou fascinado por uma das dançarinas, a que tinha os olhos cor de esmeralda. Tal era o seu fascínio, que despencou do rochedo, ganhou aos trambolhões a prainha, metendo-se de permeio na farândola, acabando de mãos dadas com a sua escolhida. Declarou-se apaixonado por ela, e confiou-lhe o seu desejo de permanecer a seu lado por toda a eternidade.

Por artes de Anhangã, a bailarina falou-lhe na língua que era a sua.
- Tens de partir, homem estranho! Gosto de ti, mas tens de partir!
- Nunca! Nunca arredarei os pés de perto de ti, meu amor! Roga ao teu deus que me permita gozar de teu carinho e da tua eterna companhia.
- Para que vivas comigo é necessário que morras.
- Morrerei, se isto é preciso.
- Vem, então, meu doce amor. A fonte da vida nos chama... partamos.
Mãos entrelaçadas, ao canto fúnebre das dançarinas, os jovens entraram águas a dentro e quando desapareceram, já o sol era vitorioso. As encantadas sumiram nas águas profundas, para nunca mais aparecer. E, desde então, a gruta está solitária, e nela ecoam e se quebram os ecos dolentes e eternos do mar.AS

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